terça-feira, 1 de agosto de 2017

Texto comparativo da história narrada por Hans Staden no livro "Viagem ao Brasil" e do poema épico de Gonçalves Diaz "I-Juca-Pirama"

               Nessa postagem, que é uma cópia do trabalho que desenvolvi para a matéria de Literatura Brasileira do curso de Letras, estabeleci uma comparação da narrativa do livro “Viagem ao Brasil” de Hans Staden e do épico “I-Juca-Pirama” de Gonçalves Dias. É importante saber que a obra de Hans Staden se trata de um texto informativo, sendo considerada Literatura de Informação, em que o caráter descritivo tem imensa predominância. Sobre a segunda obra, trata-se de um poema épico no qual o caráter estilístico está empregado fazendo com que a obra não seja apenas um registro de costumes, mas sim uma arte que além do conteúdo possui uma forma de elevado grau.
            Na primeira e segunda estrofe do poema já se percebe uma glorificação dos indígenas e da natureza brasileira, que tanto se observa na obra de Staden como em outros documentos histórico, em exemplo a carta de Pero Vaz De Caminha.
Ao relatar que “Os velhos sentados praticam d’outrora”, Gonçalves parece referenciar um fato narrado por Staden, o qual dizia que os chefes se sentaram ao luar para conversarem, e, na representação gráfica presente no livro de 1930, estes aparecem fumando.
Sobre o ritual que é feito para a preparação do prisioneiro, percebe-se imensa semelhança das descrições do épico de Gonçalves com os fatos narrados por Staden como por exemplo: a dança realizada pelas mulheres ao redor do prisioneiro, cantando a morte deste e provocando-o; a bebida cauim que preparam e bebem antes da cerimônia; a corda muçurana com a qual o prisioneiro é amarrado no centro da festa; a ato de convidar tribos vizinhas para o ritual de antropofagia; a fogueira que é acesa na frente do prisioneiro; o preparo do ivirapema, pintando-o e adornando-o com penas; o escalpelo e o tingimento dos membros da vítima, realizado pelas mulheres; a saia enduape, feita de penas, que põem no índio refém; o canitar emplumado também colocado no índio. Pode se observar todas essas semelhanças citadas no texto Staden (1930, p.87): “Convidam então os selvagens de outras aldeias para aí se reunirem naquela época”; “Enchem todas as vasilhas de bebida[...]”; “[...]conduzem o prisioneiro uma ou duas vezes pela praça e dançam ao redor dele”, etc. Também se encontra no poema de G. Dias, “Convidam-se as tribos dos seus arredores”; “Acerva-se a lenha da vasta fogueira/Entesa-se a corda da embira ligeira/Adorna-se a maça com penas gentis[...]”, etc.
No verso “Que soube ufano contrastar os medos/Da fria morte” pode-se compreender que esse enfrentamento do medo, e morte com orgulho tem relação com o fato de o prisioneiro “atirar pedrinhas” nas mulheres que o provocam, e defender-se prometendo vingança dos seus semelhantes para com a tribo que está a assassinar lhe (STADEN, 1930, p. 87). Trata-se, portanto, de morrer honradamente.
            Coerente é a descrição de Gonçalves ao índio encarregado do assassínio, pois, segundo Hans este índio era geralmente de grande prestígio na tribo [...] aquele que deve matar o prisioneiro vai com 14 ou 15 dos seus[...]”. Daí o belo semblante desse guerreiro descrito por Gonçalves, “Em larga roda de novéis guerreiros/Ledo caminha o festival Timbira/ A quem do sacrifício cabe as honras[...]”.
O canto IV do poema é cantado pelo índio que fora aprisionado, logo antes disso o índio encarregado de mata-lo diz-lhe "Dize-nos quem és, teus feitos canta/Ou se mais te apraz, defende-te". Muito semelhante ao comportamento que Staden descreveu de os dois envolvidos, assassino e prisioneiro, trocarem insultos.
            Após o discurso do índio preso, o chefe Timbira manda-o soltar no poema. Não fora, porém, de piedade, mas porque o índio tupi, aprisionado, chorou perante a sua morte e como bem recita o chefe da tribo: “[...]E tu choraste! ...parte; não queremos/Com carne vil enfraquecer os fortes. ” Esse gesto mostra que honra do guerreiro deve ser posta à prova, daí as provocações citada por Staden (1930, p.88) “dão lhe pedrinhas para ele arremessar sobre as mulheres que andam em volta ameaçando devorá-lo.” Tudo isso para que o índio a ser devorado mostrasse sua honra na morte, defendendo-se, jurando vingança e morrendo com honra, para que desse modo –como eles acreditavam– pudessem incorporar a energia ele, assim que o devorassem.
            O culto da morte é tão glorificado quanto a vida dos indígenas, segundo Staden o índio a ser morto defende a si mesmo “Depois de morto, tenho ainda muitos amigos que de certo hão de me vingar” (STADEN, 1930, p. 88). Isso esclarece a atitude do velho, no poema épico, de levar seu filho a tribo dos inimigos timbiras para que se cumpra o ritual, após ter percebido que este fugira em nome de seu pai. E também justifica a atitude de o índio lutar bravamente no canto IX, pois o chefe da tribo timbira havia-o precedido estas palavras: “É teu filho imbele e fraco!  [...]Ele chorou de cobarde/Nós outros, fortes Timbiras/Só de heróis fazemos pasto. ”; desmerecendo seu espírito valente e deplorando-o como vil.

Referências:

STADEN, Hans. Viagem ao Brasil. Tradução de: LOFGRAN, Alberto. Rio de Janeiro: Oficina Industrial Gráfica, 1930.
DIAS, Gonçalves. “I-Juca Pirama” Poemas de Gonçalves Dias. Ed. Péricles Eugênio da Silva Ramos. São Paulo: Cultrix, 1980.





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